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quarta-feira, 30 de novembro de 2011

A Autogestão, a Democracia Direta e a Guerra Civil Espanhola

Vinícius Fruscalso Maciel de Oliveira
Acadêmico do curso de Licenciatura em História pela UFFS

É possível a autogestão no capitalismo? Não, mas... Qual foi a experiência mais próxima de uma autogestão que a humanidade chegou na modernidade? Certamente as experiências ocorridas durante a Guerra Civil Espanhola!
Espanha, 1936. Em fevereiro a coalizão socialista, de republicanos e outros partidos de esquerda foram vitoriosos na eleição geral. Proporam reformas democráticas. Os latifundiários, os industriais, igreja e as forças armadas temeram o aumento da classe operária. 18 de Julho. Houve uma insurreição militar liderada pelo Fascista general Franco contra o governo democrático. Apoiadores do governo formaram milícias para a defesa. Organizados por sindicatos e partidos políticos foram à luta por seus direitos democráticos contra os fascistas.
Durante a Guerra Civil Espanhola (1936 – 1939), a gestão em várias comunas rurais e fábricas foram exercidas de forma direta pelos trabalhores, já que houve tanto a coletivização das terras como a coletivização das fábricas, ou seja, dos meios de produção. Entendo que a autogestão “seria uma relação social específica, uma relação de produção, o que significaria relações de trabalho e de distribuição. A autogestão seria a decisão coletiva dos produtores sobre o processo de produção. A autogestão é uma relação social fundante de uma nova formação social, uma nova sociedade” (Viana, p. 60)
Não se pode chamar a experiência espanhola como uma autogestão plena, pois os trabalhadores, dadas às circunstâncias, produziam não somente para consumo e também para a perpetuação armada, caso contrário eles mesmos estariam se prejudicando ao não fornecer suporte, seja com comida, seja com armas, aos milicianos.
Mas por outro lado, pode-se chamar de democracia plena, sem dúvida. Vozes nunca antes ouvidas agora podiam além de participar da produção e receber benefícios conforme o seu trabalho, podia também votar nas assembleias realizadas no interior de cada meio de produção (seja ele agrário ou urbano).
Em 1937, POUM (Partido Operário de Unificação marxista) une-se à CNT (Confederação Nacional dos Trabalhadores) para impedir o avanço das tropas fascistas por toda a Espanha. Insatisfeito com tal atitude, Stalin cancela o fornecimento de armas aos trabalhadores e envia um exército para prendê-los, afirmando que a POUM agora é uma instituição ilegal e que deve render-se as Brigadas Populares, que eram controladas pelos stalinistas. Além disso, uma série de milicianos foi declarada prisioneiros.
Os espanhóis criaram um organismo econômico que era organizado “de baixo para cima”. A administração das fábricas na Catalunha funcionava através de um conselho de fábrica, formado tanto por “proletários”, como por “especialistas”, onde prevalecia a democracia e a soberania popular. Cada cabeça, um voto, independente da posição que o trabalhador ocupava na fábrica. Por sua vez, as fábricas se organizavam em sindicato ou seção e os mesmos em conselhos locais de ramo (alimentação, por exemplo), do qual as uniões de todas as seções locais formavam uma seção regional, que era vinculado à seção nacional. Além disso, todas as seções locais, independente de que ramos sejam, eram vinculadas ao conselho local de economia. O mesmo acontecia em âmbito local e nacional.
Os revolucionários utilizavam estatísticas para saber qual era a necessidade de produção um cada setor da economia, o que se deve produzir mais, onde, em que condições, visando sempre, em primeiro lugar o consumo interno e a manutenção do movimento revolucionário, o qual tornava possível essa forma de gestão.
Nildo Viana finaliza seu artigo sobre “democracia e autogestão”, dizendo o seguinte: “A autogestão seria o conceito fundamental de uma sociedade futura e, portanto, incompatível com democracia representativa” (Viana, p. 70).
No filme “Terra e Liberdade”, o personagem David Carr é um inglês que sai de seu país para combater os fascistas na Guerra Civil Espanhola. David é stalinista, mas acaba sendo levado não as Brigadas Populares, e sim a uma milícia da POUM. Indignado com a precariedade das armas, decide ir a Madri e se juntar aos stalinistas. Acaba ficando decepcionado quando percebe que os stalinistas estão lutando (incluindo ele mesmo) contra os anarquistas em Madri e, consequentemente, contra a revolução. Numa cena no mínimo melancólica, David acaba por rasgar seu certificado de filiação no Partido Comunista e volta a atuar numa milícia da POUM.
Conclui-se a partir do que foi visto tanto no filme, quanto no artigo, que a autogestão nunca foi realizada de forma plena na sociedade moderna. Mas houve um pequeno germe dela chamado Revolução Espanhola, onde ficaram comprovados seus benefícios infinitamente melhores para os trabalhadores do que no regime tradicional capitalista.

Referências Bibliográficas

1 – VIANA, Nildo. Democracia e Autogestão. S.d. Disponível em: www.achegas.net/numero/37/nildo_37.pdf

2 – Terra e Liberdade (Land and Freedom, 1995). Diretor: Ken Loach. 109min.

3- ABAD DE SANTILLÁN, Diego - O Organismo econômico da revolução—A Autogestão na Revolução espanhola. Brasiliense, 1980.


2 comentários:

  1. Uma grande experiência a Guerra Civil Espanhola, principalmente para quem busca pensar a autogestão. Desde muito já estamos discutindo acerca dos beneficios da autogestão, e acredito que será ela uma das alternativas para superarmos essa racionalidade capitalista. Toda a administração criada durante a Guerra Civil, nos mostra, uma vez mais, que sim, é possivel penarmos e nos organizarmos para além de uma maneira heteronoma, sem alienarmos nosso trabalho e vontade.

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  2. Concerteza temos muitos exemplos de que a autogestão é mais democrática que o modelo capitalista.
    Porém o capitalismo vem se reproduzindo de tal forma que hoje falar em um modelo de sociedade auto gestionária é quase um crime, os que lutam para que este modelo seja novamente implantado são tachados de "baderneiros que não tem o que fazer," mas o que a maioria não sabe é que se realmente queremos ser livres precisamos nos libertar deste modelo de produção e consumo de futilidades que hoje parece ser isso é tão normal a ponto de não percebermos que isso não é ser livre isso é subordinação é ser escravo desse modelo capitalista.

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