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sexta-feira, 27 de abril de 2012

ÁGUAS, TERRITÓRIOS E CONFLITOS: (DES) AFOGANDO SONHOS

ENERGIA E CIDANIA - A luta dos atingidos por barragens 
Angélica Rossi1, Sian C. Alegre2

No decorre da história do homem, as barragens foram ganhando importância fundamental para o progresso humano, fato esse que ganha força com a Revolução Industrial e a crescente necessidade por energia. O problema energético brasileiro está no fato de que o modelo adotado apenas beneficia os poderosos, visto que o governo está submisso ao mando de empresas. As consequências das UHE quase nunca são pensadas e reparadas efetivamente. As transformações ao lugar são as mais diversas: inchamento populacional, aumento na natalidade, consumo de drogas, desestruturação familiar, criminalidade. Ainda, a que se considerar as questões identitárias, em que muitas pessoas mantém um apelo simbólico para com o lugar, nesse caso, transtornos psíquicos são comuns, já que estas não conseguem identificar-se com a nova moradia. Assim, para o MAB, as UHE constituem-se uma ameaça desde seu planejamento até muito tempo após seu funcionamento. Os impactos aos atingidos são materiais e imateriais. Dentre as formas utilizadas para a concretude das UHE, destaca-se a violência simbólica (BOURDIE 2007), segundo o autor, é quando o discurso dominante é aceito como legitimo pelos dominados, sem que percebam. Nessa lógica, a persuasão para a construção das UHE é essencial. Para tal fim, “(...) utilizam linguagem técnica de difícil compreensão, realizam intensa propaganda sobre os benefícios do empreendimento, disseminam informações imprecisas ou desencontradas.” (BENINCÁ, p. 61). A partir dos anos de 1970 é que o Brasil inicia um plano desenvolvimentista, que respectivamente acaba por determinar o modelo energético ao qual tratamos aqui. Com o governo de Emílio Garrastazu Médici (1969 – 1974), o país viveu o período conhecido como “milagre econômico”. Nesse momento o país destacava-se por investimentos do capital estrangeiro, empréstimos facilitados no exterior, alta nas exportações e baixas taxas de inflação. A partir de 1974 o “milagre econômico” começa ter seu fim. O Brasil torna-se refém de políticas internas, devido a sua divida internacional. Se por um lado a tinha-se a proliferação de problemas sociais, por outro, tais condições foram fundamentais na organização e resistência da sociedade civil. Com o fim do regime militar, a esquerda no Brasil começa a ter maior movimentação, destacando-se o movimento sindical, comunidades eclesiais de base, movimento político e movimentos populares. Em 1980 é fundado o Partido dos Trabalhadores (PT), congregando e combinando suas forças e atuações juntas a movimentos sociais. Ao final da década de 1970 e inicio de 1980, inicia-se entre os atingidos uma organização, esta faz-se em três regiões: Região Sul, Região, Região Norte. Identidade, organização e diretrizes do MAB- Para se constituir a identidade de uma organização, é necessário que haja uma identidade coletiva, ideais em comum, enfim, uma causa em comum. As partes que constituem o MAB são: “camponeses, trabalhadores rurais, ribeirinhos, quilombolas, indígenas, populações urbanas e outros que pertencem a grupos sociais inferiorizados e invisibilizados.” (BENINCÁ, p. 94). O MAB é um movimento social do campo que apresenta uma enorme diversidade. Cada organização pode apresentar formas distintas resistência às barragens. Alguns atingidos se organizam durantes o planejamento da obra, ao passo que outros organizam-se após começar a obra ou mesmo depois de estar em funcionamento. Dentre os principais objetivos do MAB estão: “resistir contra a construção de barragens que provoquem danos sociais e ambientais; lutar para que nenhuma barragem seja construída sem acordo com a população; defender a permanência do povo na terra; reivindicar garantia de justa indenização ou reassentamento aos atingidos; proporcionar formação aos integrantes do Movimento; ampliar o número de militantes; discutir e propor um novo projeto energético para o país que garanta, entre outros itens, utilização de fontes alternativas de geração, acesso à energia para todos, com tarifas populares para os consumidores familiares.” (BENINCÁ, p. 1000, grifo meu). Ainda, o MAB posiciona-se contra a “(...) privatização do setor elétrico, e defende que a energia e os recursos hídricos sejam controlados democraticamente pelos trabalhadores. Combate o desenvolvimento capitalista e propugna pela implantação de outro sistema social identificado com o socialismo.” (BENINCÁ, p. 100). O MAB organiza-se em grupos de base, que consistem em cinco ou dez famílias. Para cada grupo de base a um coordenador e uma coordenadora, sendo que entre eles é indicado os membros da coordenação municipal. Dentro desta, é extraído alguns para e coordenação regional, da regional sai nomes para a estadual e desta para a nacional. Há ainda uma direção que desmembra-se em grupos, estes tem o trabalho de encaminhar trabalhos mais específicos. Seu órgão máximo é o congresso nacional, este ocorre a cada três anos. De acordo com Benincá, o MAB apresenta três grandes momentos em sua história: Primeira fase – ao fim de 1970 a 1991 tem-se a gestação do movimento, em que as experiências regionais foram fundamentais para organização da luta contra as barragens. Surgem às bases para dar inicio ao movimento. É nesse momento que o MAB começa a atentar para as questões ambientais na luta de seus direitos. Segunda fase – esta fase vai de 1991 até 2002, é nesse período que o MAB expande suas ações ao nível nacional, assim como, o diálogo como outros movimentos no país e fora deste. Outra ação do movimento foi o de questionar com maior tenacidade a matriz a energética brasileira, e a forçar a busca por outras fontes de energia Nesse contexto, segundo Benincá, o MAB caracteriza-se por duas frentes de lutas: a de resistência para manter a população rural e seus direitos e a luta propositiva, em que buscam alternativas ao modelo energético brasileiro. Terceira fase – inicia-se em 2003, nesse momento tem-se a posse do então presidente Lula, expectativas de boas novas para alguns e decepção futura para outros. Com isso, o MAB aumenta sua ênfase ao alcance de uma democracia participativa. O movimento também vem intensificando as discussões sobre o modelo energético do país, assim como na busca pela tarifa social, desta forma, opondo-se a organização capitalista. BENINCÁ (2011) demonstra no posicionamento do MAB, a crítica à lógica consumista, de onde advém o questionamento: energia para quem e para que. Podemos ressaltar ainda, que o MAB tem interesse de avanço nas questões de democracia, cidadania, justiça, e a criação de outro projeto energético, que por sua vez necessita de um novo modelo social, político e ecológico. Entre as proposições, destacam-se a defesa de uma globalização contra-hegemônica, baseada em princípios de solidariedade, cooperação, equidade. As resistências centram-se em protestos, marchas, na busca de amparo jurídico, e também na arte, além das denuncias midiáticas. O MAB é acusado ainda, de bloquear o desenvolvimento econômico e perturbar a ordem social, mesmo tendo em vista seu objetivo de defender a água e energia como direitos fundamentais a população. As conquistas do MAB centram-se no atraso ou desistência na construção de usinas. Mas, tendo na utopia um fator fundamental, o MAB continua sua luta em defesa da vida.
REFERÊNCIAS
BENINCÁ, Dirceu. Energia e cidadania: a luta dos atingidos por barragens. São Paulo: Cortez, 2011.
1Acadêmica do curso de História da UFFS – Campus Erechim - angelica.rossi.uffs@gmail.com
2Acadêmico do curso de Geografia da UFFS – Campus Erechim – sian.pk@gmail.com

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