Sian Carlos Alegre[1]
[...] o governo do homem pelo homem, qualquer que seja o nome que lhe atribui , é opressão; a maior perfeição da sociedade encontra-se na união da ordem e da anarquia (PROUDHON, p.247)
Dentre muitos dos grandes teóricos anarquistas que já viveram, encontra-se Pierre-Joseph Proudhon, autor de diversas obras, dentre a qual se destaca “O que é propriedade”, livro este em que ele procura demonstrar como a propriedade vai contra a liberdade do homem, como ela privilegia a poucos em conseqüente exploração e subordinação de outros. Em sua ânsia pela defesa da liberdade do homem, Proudhon aborda diferentes concepções para provar como a propriedade é impossível, como ela é sustentada pela exploração do trabalhador e, ao mesmo tempo ela nega a sua própria existência. Dentro dessa lógica, Proudhon diz o seguinte “[...] a propriedade depois de ter despojado o trabalhador pela usura, assassina-o lentamente extenuando-o; ora sem a espoliação e o assassínio a propriedade não é nada; com a espoliação e o assassínio logo perece, por falta de sustento: portanto, a propriedade é impossível” (PROUDHON, p. 159). Este fragmento é um dentre muitas das afirmações do autor contidas no livro, que demonstram a sua indignação para com a propriedade privada.
Eis que a propriedade privada baseia-se em relações hierárquicas, em que pessoas submetem-se ao mando de outra. Já dizia Proudhon, que nem política, economia, administração e governo devem estar baseados na propriedade (p. 242). A propriedade, continua o autor, vai contra a igualdade, ela fundamenta-se no “mérito” individual da pessoa e esquece o trabalho coletivo. O que temos hoje é que com o reconhecimento da propriedade como algo “justo”, “legitimo”, fruto do trabalho e esforço de quem a conseguiu por “seu mérito”, tem-se a legitimação de leis e da violência a fim de garantir ao dono desta a sua proteção. Mas o que não se leva em consideração é o fato de que, conforme o próprio Proudhon já nos dizia, que todo o trabalho dos homens resulta de uma força coletiva (p. 246), da acumulação do esforço de vários homens, o que faz da propriedade também coletiva, já que esta não é fruto de uma ação individual. Sendo assim, justamente o que é utilizado para dar crédito à propriedade, é na realidade o que a torna coletiva, ou mesmo a destrua, ou nas palavras de Proudhon, “[...] o trabalho destrói a propriedade.” (p. 246)
Porém, ao passo que a propriedade é despótica, não admite a igualdade e a lei[2] (p. 242), a comunidade, mesmo que venha a garantir a solidariedade e, a igualdade como nivelamento, ela passa, segundo Proudhon, a vir contra a independência do homem, torna-se tirânica e injusta (p. 242). Se esta, conforme o autor, negar a proporcionalidade e a independência, dar-se-á opressora. Pois, se a comunidade está centrada em uma racionalidade uniforme, sob a perspectiva de uma única proporção ou necessidade, temos ai um risco para o homem quanto indivíduo independente. Desta maneira, se na comunidade a liberdade de ser, de agir, se a independência de uma pessoa não for reconhecida, a ponto de ser negada, ou até mesmo reprimida, se ela tiver que negar sua liberdade perante a vontade da comunidade, o que temos de fato será a ditadura da maioria sobre a minoria. Mesmo a comunidade garantindo a solidariedade e a igualdade, Proudhon enxerga-a como risco a liberdade, já que em sua vivência, algumas pessoas podem não se encaixar nos padrões que a comunidade segue e serem perseguidas por isso.
A busca pela liberdade requer o reconhecimento a cerca das necessidades, já que estas podem ser diferentes de uma pessoa para outra. Assim, ao pensar uma lei para a sociedade, a ela cabe basear-se na necessidade, na garantia do direito a poder assegurar a existência, ao mesmo tempo pensando no dever para com as mesmas necessidades e direitos dos outros. Ou como diria Proudhon, “A liberdade é anarquia, porque não admite o governo da vontade mas só da autoridade da lei, quer dizer da necessidade.” (p. 243).
Se considerarmos a afirmação de Proudhon, veremos que “A liberdade é igualdade, porque a liberdade só existe no estado social e fora da igualdade não há sociedade.” (p. 243). A partir daí pode-se considerar que a liberdade está intrinsecamente ligada à igualdade, ao respeito a todas as vontades, obviamente que nos limites da lei (p. 243). Por sua vez, é possível admitir que a propriedade apresenta-se como o suicídio da sociedade (p. 243), já que ela viabiliza a desigualdade entre os homens, já que ela privilegia apenas seu (s) proprietário (s), fomentando dessa maneira uma sociabilidade baseada na exploração e na subordinação entre as pessoas.
Por mais que os discursos ouvidos hoje vão totalmente a favor da propriedade (e com ela todas as desgraças que já vimos), é necessário que atentemos para fatos ou escritos que demonstrem que é possível haver outras maneiras de sociabilidade, de vivermos de forma em que as desigualdades sejam mínimas, ou inexistentes. A negação da propriedade é uma dentre tantas outras medidas a serem pensadas em prol de uma sociedade justa e igualitária, sem relações de mando e obediência, sem explorados e exploradores, ou seja, uma sociedade fundamentada na LIBERDADE.
Referências Bibliográficas:
Proudhon, P. J. O que é a Propriedade. Tradução Marília Caeiro. Editorial Estampa Lisboa. 2 edição. 1975.
[1] Acadêmico do curso de Licenciatura em Geografia pela Universidade Federal de Fronteira Sul (UFFS), campus Erechim – RS.
[2] O sentido de lei ao qual me refiro aqui não é a mesma que se tem hoje, de acordo com Proudhon a lei deve estar baseada na necessidade e respeito à independência de cada pessoa. Para saber mais ver também Proudhon, Principio de Autoridade.
isso mesmo sian temos que acabar com essas diferenças socias, e por mais que isso não venha de hoje, não podemos desistir diante das dificuldades
ResponderExcluirvai la camarada
Saudações
Bjoooo
Sian, meu camarada!
ResponderExcluirÉ interessante ver como as posições de Proudhon variam de um texto e outro. Não quer dizer isso que ele é incoerente em relação aos seus próprios pensamentos, mas justamente que cada posição tem relação com uma circuntância histórica e uma luta social particular...
De todo modo, vale recordar que Proudhon, ao chamar a propriedade de roubo (pela resultante multi-social que a torna possível como bem produtor de riqueza), reconhece nela também um princípio de independencia (desde que não utilizada para instrumentalizar trabalho assalariado): caso dos camponeses e artesãos, como pequenos proprietários autonomos e... anticapitalistas! (pelo menos da perspectiva do sistema, que quer separá-los dos meios de produção).